quinta-feira, 4 de março de 2010

Que ninguém lave as mãos

Que ninguém lave as mãos quando um miúdo de 12 anos decide matar-se porque não aguenta mais levar pancada na escola.

Que ninguém finja que não viu, que não ouviu, que não sabia, que é um caso isolado, que etc e tal numa conversa que dá vómitos.

Que ninguém invente inquéritos para perder tempo, para voltar a lavar as mãos de novo, para fingir que daqui para a frente tudo vai ser diferente.

Que ninguém se atreva a adormecer tranquilo e a acordar como se o amanhã fosse apagar o que se passou hoje.

Sabem o que me enoja mesmo?
Daqui a uns dias aquele miúdo de 12 anos vai deixar de ser notícia. Mais ninguém vai querer saber de uma escola em Mirandela, todos vão estar em amena hibernação até ao próximo miúdo de 12 anos decidir matar-se porque não está para ser saco de pancada. E muito menos para se sentir tão só porque ninguém abriu os olhos para o ver.

Que pais, que professores, que educadores temos, que nem reparam num miúdo de 12 anos?

Eu andei num seminário. Digam o que disserem, acreditem no que acreditarem, mas foram dos melhores anos da minha vida. Já na altura havia miúdos terríveis, com infâncias complicadas e com tendência para malhar nos outros. Por isso, não se atirem aos miúdos que batem como se fossem eles os principais responsáveis, não lavem as mãos, repito.
No meu colégio havia professores, auxiliares, educadores ou até alunos mais velhos e responsáveis sempre a supervisionarem cada centímetro daquele colégio, cada esquina dos espaços de recreio. Havia sempre um responsável a controlar os grupos, as brincadeiras, os jogos. Foi nos salesianos, que adoptam algo de interessante como "sistema preventivo". Antecipar é melhor que reagir, premiar o mérito é melhor que castigar. Ali, os adultos não se demitem.

Que ninguém lave as mãos quando um miúdo de 12 anos decide matar-se porque não aguenta mais levar pancada na escola.

Que ninguém lave as mãos. Não é bonito ver água ensanguentada a fugir pelo ralo...

4 comentários:

Anónimo disse...

Situação que me deixou indignada. Há quem pense que não, mas na escola uma criança pode vir a sofrer muita pressão. Há sempre o grupo dos mais fracos e os mais fortes, os mais espertos e os menos espertos, etc., e aquele que se inclui no grupo dos "menos" são sempre castigados. E é um absurdo, um total absurdo adultos não verem isso. Não é de hoje o que acontece nas escolas, talvez hoje esteja apenas mais em evidência, ou uma violência maior, mas sempre aconteceu. Aliás, talvez não sejam as crianças a se tornarem piores, mas os adultos, que, apesar de serem adultos, já não conseguem ou não querem controlar a situação.

EAM disse...

É lamentável que, hoje em dia, nem mesmo os pais prestem atenção aos filhos. É a corrida pro trabalho, depois o regresso à casa com todas as tarefas domésticas, é o jantar diante da "bruxa televisão" que não permite que se olhe nos olhos de um filho pra ver que algo não está bem.
É a falta do beijo na testa, do abraço apertado, de dizer EU TE AMO. Às vezes coisas tão simples que nos passam ao lado.
Os pais e alguns educadores tem a tendência a desvalorizar os problemas dos miúdos, achando por vezes que eles é que tem culpa.
Lembro-me de a alguns anos a minha filha ficar desesperada quando tinha aulas com um professor provavelmente meio desequilibrado. Quando levei o assunto para a reunião de pais ( onde normalmente só estão presentes meia dúzia)quase todos disseram "o meu filho também se queixou mas eu pensei que era coisa de canalha", só nessa altura é que foram tomadas providencias à respeito do tal "professor".
É isso Jorge acho que devemos todos acordar e "gritar" quando vemos que algo não está bem, mas é preciso vermos e para isso temos que mudar as nossas prioridades.
Por tudo isso mesmo os meus bebes tendo 21 e 23 anos, sabe muito bem levar um beijinho na testa, dar um abraço gostoso e dizer-lhes que os AMO olho no olho ou numa simples mensagem ao meio do dia, para que eles saibam que podem contar sempre comigo.
Devíamos todos acordar e não deixar o AMOR para amanhã, porque hoje estamos muito ocupados. Amanhã o rio pode já ter levado as nossas esperanças....

Beijinhos e desculpa o "testamento"

Jorge Pessoa e Silva disse...

Viva Paulinha

Concordo consigo, principalmente quando diz que não são as crianças que estão piores, são os adultos que estão piores e se demitem cada vez mais da sua missão.

Chocou-me ver o presidente da Associação de Pais dizer que não se passava nada naquela escola. Para um miúdo se matar é porque se passava. Podia até ser legítimo e haver uma razão muito boa para ninguém perceber, mas a morte do miúdo indica que algo de grava se passa e choca-me que a primeira reacção, para mais da associação de pais, tenha sido a de levar as mãos.

Claro que não foi preciso muito tempo até outros pais aparecerem a contar histórias de arrepiar os cabelos.

Beijinhos, linda

Jorge Pessoa e Silva disse...

Viva Fátima

Obrtigado pelo testamento :-)

Ora aí está o segredo: um beijo na testa, uma abraço, olhar nos olhos e tempo para falar. Resolviam-se mais de metade dos problemas deste mundo. E alguns pais evitavam sentir que já é tarde quando se lembram que... se esqueceram do beijo.


E por falar em beijo, um para as senhoras aí de casa e um abraço para os homens